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Kemetiyu, Cheik Anta Diop

Kemetiyu – Cheik Anta Diop (2016)

“Na África, cada ancião que morre é uma biblioteca que se queima”. A famosa frase do malinês Hampaté-Bâ, ainda que se refira aos saberes orais dos anciãos africanos, pode ser aplicada ao escritor multidimensional Cheik Anta Diop. Formado em áreas tão diversas quanto Física, Filosofia, Química, Linguística, História, Egiptologia, Economia, Sociologia e Antropologia, Diop tornou-se a principal referência dos saberes científicos e históricos afrocêntricos. A julgar por sua extensa e variada formação, a biblioteca que se queimou em sua morte é de proporções intangíveis. Mas de suas cinzas renasceu a principal universidade de Dakar, que hoje leva seu nome, assim como células multiplicadoras que imortalizaram seus saberes: os inúmeros livros que escreveu e que hoje circulam pelo mundo.

O diretor senegalês Ousmane William Mbaye soube acompanhar com perspicácia a multidimensionalidade desse pensador incansável, seguindo os rastros de seu legado e reconstruindo as lacunas de sua memória. Apesar de ser um nome conhecido no meio acadêmico africano e de africanistas, Diop é pouco lido e pouco lembrado. O fato de ser este o primeiro documentário que retrata o pensador, passados trinta anos de sua morte, é sintomático e revela aquilo que o diretor Mbaye faz questão de frisar ao longo do filme: Diop foi desqualificado tanto por acadêmicos europeus, cuja visão racista e eurocêntrica não lhe deu ouvidos, assim como pelos próprios estudantes africanos, presos em modelos marxistas de análise histórica.

Como se pode ver através de sua trajetória cinematográfica, Mbaye é um (re)construtor da memória de seu país, uma memória que precisa ser descolonizada, relembrada e reinventada. Desde de seu primeiro curta Doomi Ngacc (1979), que retrata o olhar e a revolta de uma criança do campo vendo seu pai ser explorado pelo sistema colonial, até seus últimos documentários Mère Bi (2008), sobre a trajetória militante de sua mãe, a jornalista Annette Mbaye d’Erneville, figura chave no movimento de independência e militância feminista do Senegal, e finalmente Président Dia (2012), sobre a trajetória do líder independentista Mamadou Dia.

Laurence Attali, montadora que esteve presente na sessão junto com o diretor Ousmane Mbaye, soube dar dinâmica a um filme que contém inúmeros materiais de arquivo. A trilha sonora jazzística, em diálogo com a presença do músico Randy Weston, amigo de Diop entrevistado no filme, confere um ritmo diaspórico que funciona bem. Transitando entre países africanos, França e Estados-Unidos, Kemetiyu, Cheik Anta Diop entrevista os principais pensadores, amigos e admiradores ilustres que conviveram com ele. O que mais cativa o espectador é sem dúvida ver e ouvir Diop falando: sua expressão viva e dinâmica traduz a intensidade de seu pensamento. Ainda que o filme deixe de lado o pensamento político do autor, é imprescindível para aqueles que buscam conhecer não apenas Cheik Anta Diop, mas o pensamento histórico e filosófico africano.

Assista o trailer de Kemitiyu de Ousamane William Mbaye

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Publicado por FICINE

O FICINE tem por objetivo a construção de uma rede internacional de discussões, projetos e trocas que tenham como ponto de partida e ênfase a reflexão sobre os Cinemas Negros na diáspora e no continente africano.

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