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Rasgando a tela, quebrando a corrente

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“O cinema é uma AR-15e nós negros brasileiros sabemos atirar”, afirmava Zózimo Bulbul, que destaca a passagem do negro, enquanto temática para a direção dos filmes. Deixando de estar à frente das câmeras para olhar de atrás delas, ao assumir a perspectiva da auto representação, Zózimo, Waldir Onofre e Antônio Pitanga, são atores que passam a realizar filmes na década de 70, tendo a temática racial em foco. Porém, Bulbul  é o único  a compor  uma filmografia,   e dentre suas  obras destaca-se a primeira: Alma no olho (1973), realizada com restos de película de um filme que ele havia atuado.

Alma do Olho possui uma simplicidade na forma que reflete a complexidade do conteúdo, inspirado no livro Alma do Exilio, a autobiografia de Edgridge Clearver, um dos líderes dos Panteras Negras. Evidencia o primeiro elemento que é exilado  do indivíduo na diáspora africana, o corpo negro, e no curta-metragem este corpo é o fio condutor da narrativa.

Com o fundo totalmente branco perde-se a perspectiva e a profundidade, e constrói uma sensação de encurralamento acentuada ainda mais no ponto de virada do curta, na qual o  personagem  está vestido com panos amarrados, o patuá e o corpo está dançante e livre. De repente a expressão de medo o domina e distancia-se da câmera aproxima- se da parede em busca da saída e logo após o homem está agachado com um calção branco e uma grande corrente branca nos punhos, simboliza a escravidão.

O corpo  é demarcado pela plano detalhe ; os olhos, os dentes, o suor, as costas, o peito e a bunda, remete ao fator de está historicamente exposto e coisificado. O cenário minimalista com poucos objetos e adereços todos brancos em cena assumem signos e constrói o sentido de aprisionamento, consequentemente a violação deste corpo. “A cenografia não existe como trabalho de arte autônomo, estará sempre incompleto até a ação do ator em seu espaço atuando e encontrando” (URSSI, 2006, p.77).

Por fim, quebrar a corrente branca é um ato emblemático no qual o ator/personagem/diretor rasga as telas do cinema ocupando “lugar de onde se fala”, assumindo a direção estabelecendo a luta para a auto representação, na qual, “nós estamos por nós mesmos” (Steve Biko), assim como nós falamos por nós. A luta simbólica no processo da construção da auto representação é colocado tão problemático quanto a representação, pois essa construção se dá pela desconstrução de parâmetros estabelecidos baseado nos estereótipos, é a busca de  novos referenciais para nos vê mais humanos, aliás demasiadamente humanos , apenas.

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Assista a seguir o filme:

Alma no Olho de Zózimo Bulbul

Referências :

BULBUL, Zózimo. “Alma no olho” (filme). 1973. 11 min. son. color. 35 mm (Coleção O cinema de Zózimo Bulbul).

CARVALHO, Noel dos Santos. Cinema e representação racial: o cinema negro de Zózimo Bulbul, São Paulo, 2005. Tese (Doutorado em Sociologia) – Universidade de São Paulo.

URSSI, Nelson José. A linguagem Cenográfica. São Paulo, 2006. Dissertação (Mestrado em Artes) – Universidade de São Paulo.

Leia mais sobre a obra de Zózimo Bubul aqui no FICINE, em “Zózimo Bulbul e o Cinema Negro“.

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Publicado por FICINE

O FICINE tem por objetivo a construção de uma rede internacional de discussões, projetos e trocas que tenham como ponto de partida e ênfase a reflexão sobre os Cinemas Negros na diáspora e no continente africano.

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