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7º Festival Lagunimages (2013) – Benim: cinema, culturas urbanas e o Brasil (Parte 2)

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Em sua 7ª. edição, o Festival Lagunimages (Festival internacional de filmes, televisão e documentário do Benim) dirigido por Noudeou Noëlie Houngnihin, teve o Brasil como país convidado.

Na programação de filmes brasileiros destacaram-se produções que mostram as relações e os encontros entre o Brasil e o continente africano como “Pedra da Memória” (2011) de Renata Amaral e “Ori” (1989) de Raquel Gerber. Interessante notar que a mostra brasileira foi marcada por estes filmes de realizadoras mulheres num festival impulsionado pela determinação de outras duas mulheres: Christianne Chabi Kao e Noudéou Noélie Houngnihin.

O primeiro foi escolhido como filme de abertura do festival nos apresentando o rico diálogo estético e musical entre as manifestações culturais beninenses e brasileiras dos rituais religiosos e também da cultura popular. “Pedra da Memória” também registrou o encontro entre o babalorixá Euclides Talabyan da Casa Fanti Ashanti em São Luís do Maranhão com o sacerdote vodun Dah Daagbo Avimadjenon em Ouidah, no Benim. Acompanhamos as rimas visuais, musicais e de gestos em que uma dança no Benim se torna uma outra no Brasil, e em certo momento não sabemos mais ao certo de que lado do Atlântico estamos.

Durante a primeira exibição, pescadores de Togbin, uma vila da Route de Pêche que estavam presentes reconheceram o ritual e a música registrados no filme e cantavam juntos a canção enquanto assistíamos ao filme. Naquele momento, parecia que magia do filme, da música e da dança realmente havia invadido o local da projeção para além da tela. Tal como a própria realizadora, Renata do Amaral, referiu-se à “Pedra da Memória”, tratou-se de “fazer o caminho inverso da Árvore do Esquecimento” – da árvore em Ouidah em que os escravos deveriam dar voltas para esquecerem de sua origem e identidade antes e embarcar para o Brasil, para “fomentar reconhecimentos”. Ou talvez, como uma outra árvore de um terreiro em Salvador, descrita por Roger Bastide, em que as raízes atravessam o Atlântico e que faz com que os cantos e danças reverberem de um lado a outro do oceano.

Também foi impactante a projeção do filme “Ori” (1989) de Raquel Gerber, com a narração da historiadora e militante negra Beatriz Nascimento, que permitiu ao público beninense conhecer manifestações da cultura afro-brasileira, as histórias de resistência dos quilombos e do movimento negro no Brasil. No evento “Periferia no centro da produção cinematográfica brasileira: uma história de continuidade e de rupturas”, foram projetados trechos do filme “Videolências” do coletivo Núcleo de Comunicação Alternativa (NCA) da zona sul de São Paulo, mostrando as reflexões e desafios de grupos de jovens da periferia que produzem vídeos populares sobre a própria realidade local, questionando a representação da periferia no cinema e na televisão. Destacamos também a projeção do filme “À Sombra de um delírio verde” (2011) de Cristiano Navarro, Ann Bacaert e Nicolas Muñoz que trouxe a violenta realidade enfrentada pelos Guarani- Kaiowá no Mato Grosso do Sul, em nome do mercado de etanol e do desenvolvimento dito sustentável que tem massacrado os povos indígenas.

Tal “desenvolvimentismo” também tem lugar no Benim, como observou Noëlie, após ver o filme: em breve, todas as comunidades de pescadores da Route de Pêche, que liga Cotonou à Ouidah, serão expulsas para dar lugar a um grande empreendimento que prevê a pavimentação de uma grande estrada e a construção de complexos hoteleiros de luxo.

Ressaltamos, mais uma vez, a importância deste festival que prioriza o acesso do público beninense a filmes africanos, diaspóricos e outras produções internacionais, além de desenvolver atividades de formação e sensibilização no campo do audiovisual, como nas relevantes ações voltadas para o público infantil e juvenil.

O Festival Lagunimages ocorre quase sem subvenção ou apoio financeiro, contando com o empenho e dedicação de duas mulheres – Christianne Chabi Kao e Noudéou Noélie Houngnihin. Além disso, a associação e a organização do festival conta com o trabalho e engajamento de muitos voluntários. Para a 7a edição contou com o apoio inestimável de: Adjovi Christpeutou, Amoussouvi Odile, Annette Balogoun, Badarou Aboubacar, Bouraima Manzoukoth, Brice Guehou, Brigitte Mäntele, Djidonou Orlane, Elfried Eyebiyi, Joel Chabi Kao, Jules Koukpode, Justin Nobime, Lionel Hounsou, Marcel Houndonougbo, Marcelle Marcos, Miriam Chodaton, Ozeas Guedezoume, Rachelle Chabi Kao, Rosalie Daahgue e Thierry Houssou.

E que venham as próximas edições!


*Imagem: Route de Pêche – caminho de Cotonou à Ouidah, onde há várias comunidades de pescadores, como as de Fidjirossé e Togbin onde ocorreram algumas projeções do Festival.

**Fui convidada pela Associação Lagunimages a participar da 7ª. edição do festival, que ocorreu entre os dias 5 e 8 de dezembro, como conselheira de programação da filmografia brasileira e tive honra de ser eleita madrinha do Lagunimages 2013. Agradeço imensamente a todos da Associação Lagunimages, em especial a diretora Noudéou Noëlie Hougngnihin e a presidente Christiane Chabi Kao, pelo gentil convite, pela acolhida e tudo mais. Meus agradecimentos também à Embaixada do Brasil no Benim, ao Sr. Embaixador Arnaldo Caiche d’Oliveira, ao João Paulo Marão e Gabriela Oliveira. Também agradecemos todos os realizadores e produtores que cederam os filmes para o festival: Renata Amaral, Raquel Gerber, Cristiano Navarro, Daniel Fagundes e Núcleo de Comunicação Alternativa.

***O Ficine agradece à colaboração da Casa das Áfricas.

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Publicado por FICINE

O FICINE tem por objetivo a construção de uma rede internacional de discussões, projetos e trocas que tenham como ponto de partida e ênfase a reflexão sobre os Cinemas Negros na diáspora e no continente africano.

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